Nesta quinta-feira (21) a família de uma garota de 11 anos procurou a delegacia para denunciar um pastor que teria abusado sexualmente de meninas dentro de uma igreja na Vila Kennedy, Zona Oeste do Rio de Janeiro.

Os abusos teriam acontecido dentro da Primeira Igreja Batista, onde o pastor Antônio Carlos de Jesus Silva, de 51 anos, pregava. Para os familiares, que frequentavam a congregação, foi difícil assimilar os fatos contados pela menina.

O crime foi descoberto quando a menina conversava com o avô. O diálogo a seguir é narrado por um parente da vítima.

“Ela falou assim: ‘vô, o que que é estupro?’ Aí, meu pai falou assim: estupro é quando uma pessoa pega a mulher a força, leva ela para o canto e faz certas coisas com ela que não pode”, explicou o parente.

“Aí, ela falou assim: ‘Mas, vô, eu quero saber por causa que (sic) o pastor veio por trás de mim, se esfregou em mim, me agarrou por trás e se esfregou. Aí, meu pai foi e tomou um susto na hora, né? E falou: ‘Que isso, menina? É verdade mesmo? É, vô, to falando a verdade. Ele se esfregou em mim…”, relatou o familiar.

A situação se agravou para o pastor quando outra vítima criou coragem e contou que também foi abusada pelo mesmo pastor. Hoje adulta, a mulher disse que sofreu a violência quando tinha 8 anos.

Outro caso relatado pela menina teria acontecido no consultório do pastor. Ele também é psicólogo e atende dentro do shopping de Bangu, na Zona oeste. Antônio Carlos ofereceu sessões de terapia de graça para a criança. Durante os encontros, ele não permitia que a família ficasse.

“Ele falava que era para ela entrar com ele, né? Para ela desabafar. Como a gente confiava nele, há muitos anos conhecendo ele, a gente achou que não ia ser nada demais. É um profissional e ela estava realmente com probleminha de saúde, a gente queria ver ela ficar boa, né?”, detalhou a avó.

Entretanto, depois das sessões, a família notou uma piora na criança. Foi preciso aumentar a dosagem de remédio e, às vezes, a menina chorava. O diagnóstico atribuído a ela era de ansiedade.

Mas no fim de uma das consultas, a mãe e avó estranharam o comportamento da criança. Em conversa com a mãe, a menina relatou ter sido beijada no pescoço pelo pastor.

“Eu perguntei pra minha filha assim: por que você está assim? Aí, ela falou: mãe, o pastor, ele beijou meu pescoço, passou a mão nos meus peitos e botou eu sentada no colo dele. Eu falei: verdade, mesmo? É, mãe. Tô falando a verdade . Ele fez isso comigo, ele passou a mão nos meus peitos.”

Após os relatos da criança, a família registrou queixa na polícia no dia 27 de abril na Delegacia de Atendimento à Mulher de Campo Grande. Uma gravação de uma conversa entre o pastor e a menina foi incluída no inquérito.

Chamado para depor, o religioso negou todas as acusações. Ele alegou ter se oferecido para atender a menina no consultório porque ela começou a ter surtos psicóticos e também “possessão demoníaca”. Além disso, ele disse que a menina teria revelado que era transsexual e a família teria ficado estarrecida. Disse, também, que ele estaria trabalhando a comunicação com a criança.

O pastor ainda acrescentou que a criança teria criado uma personagem chamada “menina safadinha”, e que ele seria o “amiguinho safadinho”. Com essa “comunicação”, afirmou em depoimento que teria conseguido descobrir revelações suicidas da criança.

A delegada responsável pelas investigações, pediu a prisão preventiva do pastor por estupro de vulnerável. Em maio, o Ministério Público estadual denunciou Antônio Carlos à Justiça e pediu que ele fosse proibido de se aproximar e manter contato com a vítima ou familiares dela.

 

O pastor era réu primário e diante disso, o MP entendeu que a prisão não era necessária  e o processo está em um impasse na Justiça.

“A Justiça está no conflito negativo de competência. Ou seja, uma vara especializada em violência doméstica e uma vara comum estão discutindo de quem é a competência para processar o caso. A ponto de se levar para segunda instância no Tribunal de Justiça essa resolução”, explicou o advogado Carlos Nicodemos Oliveira Silva.

“Um caso que foi registrado em 27 de abril de 2021, e até o presente momento não tem uma medida aplicada em relação à prisão do acusado, à produção das provas , oitivas das vítimas e testemunhas, o que gera um prejuízo, e que gera uma revitimização para todas elas”, lamentou o advogado.

Cinco meses depois do registro na polícia, a Primeira Igreja Batista na Vila Kennedy se manifestou nas redes sociais.

Disse que repudia qualquer tipo de crime e que aguarda a Justiça apurar o caso.

Enquanto isso, afirmou a congregação, o pastor Antônio Carlos está afastado do cargo de liderança do pastorado.